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Que Tipo de Ação Eu Procuro – Parte III
Respondendo dúvidas sobre os dois passos para filtrar ações que geram grandes retornos.
Caro(a) assinante,
Nas duas últimas edições, eu revelei que gosto de filtrar ações inicialmente através de:
(1) ROCE alto: para encontrar empresas com alta lucratividade e que, preferencialmente, estejam reinvestindo estes lucros no negócio.
(2) VF/CI baixo: pois o preço pago ditará os meus retornos como investidor sobre o capital já investido do negócio.
Hoje, eu utilizarei o formato de perguntas e respostas para esclarecer algumas dúvidas que possam ter surgido em relação à esta abordagem.
PERGUNTA #1: Empresas lucrativas, com alto ROCE, naturalmente serão avaliadas com um preço maior pelo mercado, e, consequentemente, terão uma razão VF/CI alta. Não é contraditório procurar por alto ROCE e baixo VF/CI, pois serão pouquíssimas as empresas que atenderão ambos os requisitos?
RESPOSTA: Muito pelo contrário, isto é exatamente porque esta abordagem faz sentido, especialmente para um investidor concentrado.
Investir é um processo cheio de incerteza e você vai “jogar esse jogo” APENAS quando as probabilidades estiverem majoritariamente a seu favor.
Com as probabilidades inclinadas a seu favor, você terá a confiança para investir uma parcela maior de seu capital nestas poucas oportunidades.
É importante ressaltar que oportunidades raras não são a mesma coisa que oportunidades inexistentes.
Vez ou outra, o Sr. Mercado terá uma de suas crises de pânico e te oferecerá negócios excelentes por um preço acessível, é geralmente neste contexto que tais oportunidades raras estarão disponíveis.
PERGUNTA #2: Qual seria o ROCE histórico mínimo que um investidor concentrado deveria estar disposto a aceitar?
RESPOSTA: Eu não gosto de criar regras rígidas, mas eu não tenho interesse em negócios com ROCE abaixo de 20%. Um ROCE de 20% significa retornos confortavelmente acima de um custo de capital de 8% ou 10%, mesmo após impostos.
PERGUNTA #3: Por que usar ROCE em vez de ROIC (que representa o retorno sobre o lucro operacional pós-impostos)? Impostos são parte do negócio, não há como ignorá-los.
RESPOSTA: Impostos devem sim fazer parte do processo de avaliação de empresas, mas o meu objetivo aqui é outro. Eu quero apenas comparar o poder de lucratividade de diferentes negócios para filtrar um punhado de boas empresas que, aí sim, passarão pelo processo de valuation.
Adicionar gastos financeiros como impostos apenas turvará tal comparação.
PERGUNTA #4: Caixa é um elemento importante do processo de avaliação de empresas, por que não adicioná-lo (subtraído de dívidas e ações preferenciais) a ambos numerador e denominador na razão VF/CI?
RESPOSTA: Caixa líquido é de fato um elemento importantíssimo e, se preferir, você pode sim incluí-lo no numerador e denominador.
Neste caso, em vez de usar VF/CI você utilizará a Razão de Faustmann – um conceito apresentando por Mark Spitznagel no excelente The Dao of Capital.
A Razão de Faustmann é obtida através da divisão do Valor de Mercado pelo “Capital Líquido” (que é o Capital Investido mais Caixa menos Dívida e Ações Preferenciais.)
A Razão de Faustmann recompensa empresas com excesso de caixa, pois caixa:
(1) é uma margem de segurança contra cisnes negros como o Covid ou crises econômicas;
(2) possui opcionalidade, ou seja, permite a empresa se aproveitar de oportunidades de reinvestimento, caso estas apareçam.
No entanto, eu ainda sim prefiro a razão VF/CI, pelos seguintes motivos:
Quanto ao primeiro benefício do caixa, eu avalio a margem de segurança através da razão entre Dívida e Caixa/Patrimônio Líquido já no primeiro passo do processo de encontrar ações. A ordem de filtragem é: RISCO -> QUALIDADE -> PREÇO, nesta ordem.
Quanto ao segundo benefício, a questão da opcionalidade, não há qualquer garantia que uma empresa com enormes quantias de caixa será capaz de investir este caixa ao ROCE histórico.
Portanto, eu já acho suficiente que o caixa esteja presente no numerador, já que o Valor de Firma é o Valor de Mercado subtraído do Caixa Líquido.
Ou seja, empresas com caixa líquida terão índices VF/CI menores.
Outra vantagem é que a razão VF/CI permita que você encontra facilmente o Retorno do Acionista sobre o capital já empregado. Se uma empresa tem ROCE de 30% e VF/CI de 5, o Retorno do Acionista sobre o capital já empregado será de 6%.
PERGUNTA #5: Um VF/CI relativamente alto é realmente algo inaceitável se a empresa tiver perspectivas sólidas de crescimento contínuo e reinvestimento de capital ao ROCE histórico?
Não necessariamente, neste caso seria provavelmente um ótimo investimento SE tal futuro se concretizar.
É importantíssimo que o investidor considere em que estágio do ciclo de vida empresarial está o negócio avaliado.
Uma empresa jovem, com um valor de mercado menor, pode ser comprada a uma razão VF/CI um pouco maior do que uma empresa madura, pois naturalmente a maior parte de sua criação de valor está no futuro.
No entanto, o investidor deve também estar ciente que, ao comprar uma empresa com um VF/CI alto demais, ele estará necessariamente apostando que o negócio terá um futuro brilhante e isso nunca será totalmente uma aposta certa.
Atenciosamente,
Laerthe Côrtes